terça-feira, 16 de novembro de 2010

A PACIÊNCIA

Minha encarnação tem sido de incomparável riqueza de experiências com espíritos de uma luminosidade maravilhosa.
Conto, agora, alguns episódios que marcaram, de forma indizível, a minha vida.
Meu avô Saad Gibran, com seu sorriso, sua doçura e sua filosofia de vida, foi um desses espíritos luminosos e de uma paciência inesgotável, demonstrando uma inteligência invulgar e uma sabedoria infinita.
Corria o ano de 1948. Tinha meus 8 anos e era o neto mais velho do vô Gibran. Entre a casa dele e a casa do meu tio mais velho Abdala, irmão de minha mãe, até hoje encarnado, havia um tipo de jardim de inverno em que as crianças brincavam à noite enquanto as mulheres (a avó, minha mãe e tias) reunidas tricotavam, os homens jogavam canastra, meu avô assentado num banco de madeira com encosto, apreciava, calado e sorridente a reunião familiar de todas as noites, invariavelmente.
Meu tio e padrinho Zé Gibran, tio Luiz e meu pai, mesmo ainda não naturalizado eram influentes políticos nas corrutelas de Clementina e Coroados, no interior paulista.
Certa noite, enquanto brincávamos no espaço entre as duas casas, parou um carro com motor ligado e motorista a postos, no portão que era passagem das casas para a rua. Desceram dois homens armados de carabina. Como neto mais velho, corri para avisar que estavam entrando homens armados. Meu pai e meus tios correram todos para se armarem, as mulheres se emudeceram apavoradas.
Meu avô levantou-se do banco e em passos vagarosos dos seus mais de 80 anos, sorriso nos lábios, rodeado de todos os netos que ali brincavam foi ao encontro dos homens, com eles travando o diálogo: - sejam bem-vindos meus filhos. Vieram visitar minha família, entrem para que minha velha lhes sirva um cafezinho passado na hora.
Os homens estarrecidos com a tranquilidade do velho, surpresos e desarmados pela sua paciência e sabedoria, baixaram as carabinas, e se desculparam: - Não sêo Gibran, obrigado pelo convite, nós estamos indo embora. Voltaram, entraram no carro e dispararam, sumindo na noite.
Quando meu pai e tios, armados, voltaram, meu avô os recebeu com um sorriso nos lábios. Disse-lhes: - bem que os convidei para entrar e tomar um cafezinho conosco, mas, eles estavam apressados e foram-se embora.
Numa outra feita, quando eu tinha 11 anos, meu tio Luiz, mais ou menos com uns 22. Era umas 4 horas da tarde e ele brigara com sua mãe, lá pelos lados da cozinha. Muito nervoso, gritava que iria embora de casa, adentrando seu quarto cuja porta dava pra sala de estar onde meu avô estava assentado numa poltrona conversando placidamente comigo. Minha avó começou a bater na porta pedindo pro meu tio abrir. Ele gritava: que estava arrumando a mala pra deixar a casa fazendo minha avó chorar desesperadamente.
Meu avô, em árabe disse: Fahta (nome de minha avó), deixa o menino. Ela aquietou-se e voltou pra a cozinha.
Meu tio continuava enfurnado no quarto, quando lá pelas seis e meia da tarde, meu avô se levantou e bateu na porta, dizendo: - Luiz, meu filho, abra a porta para o seu pai.
Meu tio: - eu vou embora assim que abrir a porta.
Meu avô, com toda a paciência: - pois é meu filho, abra a porta pra eu poder te abraçar e me despedir de você.
Passados uns longos segundos meu tio abriu a porta, abraçou meu avô e chorando pediu desculpas: - não vou mais embora, não, meu pai.
Muitos espíritos maravilhosamente iluminados e luminosos têm preenchido minha encarnação com a riqueza da sabedoria assentada no bom senso, mas, especialmente na paciência.
Tenho agora 69 anos e, graças a Deus, convivo com uma família maravilhosa cujo esteio é a avozinha Irene Cândida, mãe de Dirce, de César, avó de Lenina, Dra. Irene, Kalininho e da menina Emília, bisavó de Leandro, Lorena, Larissa, Tainara, Artur e mais algumas dezenas de outras criaturas do segmento familiar.
Sua vida sempre foi um exemplo de firmeza, doçura, bondade, e amor universal.
No interiorzão de Goiás, nos tempos mais difíceis, inclusive da guerrilha do Araguaia quando uma filha e um dos genros estiveram envolvidos, a avozinha Irene foi perseguida e nunca deixou de orar por todos, de medicar, fazendo partos de dezenas de mulheres, trazendo à luz goianinhos e goianinhas, hoje pais e avós de tanta gente.
Nos seus 94 anos, depois de uma parada cardiorrespiratória, reanimada pela filha Dirce, foi internada no Hospital do Coração.
Fui visita-la e quase chorei de emoção pela alegria com que recebeu a mim e aos demais que a visitaram naquela meia hora. Sempre alegre, feliz como se nada estivesse acontecendo consigo. Quando sua neta Irene disse-lhe que eu levara o Evangelho, ela sorriu, agradecendo a Deus pela dádiva. E ao colocar o Livro em suas mãos, ela: - Deus me inspire para que eu possa abrir o Evangelho numa lição que seja boa para todos nós. A lição: “Bem-aventurados os puros de coração”. 
Deus nos revelava, mais uma vez, que estávamos diante de um dos bem-aventurados espíritos puros de coração que ainda se encontra na Terra sempre prestos ao serviço do bem.
Áurea, que, também, visitava a avozinha, disse, na saída do hospital: - Pensamos levar conforto e fomos confortados pela candura da avozinha Irene, seu sorriso encantador, sem nenhuma reclamação e agradecendo a Deus pela alegria de nos ter ali, naquele momento.
Assim tem sido sempre. São Bem-aventurados os puros de coração porque descobriram que a compreensão e o discernimento, a pureza e a bondade, o amor e a sabedoria são qualidades advindas da paciência, que caracteriza as grandes almas neste mundão de Deus.

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